Bang bang

  • 17 de novembro de 2014
  • Categoria: Faroeste

O sangue comia a terra, os pedregulhos, o pó. Escorria do peito do Sr. Avarrias, homem rico e temido. As pernas formavam um V, o braço direito aberto, o sovaco aninhando o vermelho escuro. Perto dos dedos, o cano ainda quente. Costurra segurava a barriga, a mão molhada. Apontou o revólver para o rosto do homem, cutucou com o pé e viu que estava mesmo morto.

Olhou ao redor. As pessoas chegavam, alertadas pelo barulho. Mais por costume que por qualquer coisa, chutou a arma caída para longe e guardou a sua no coldre. Com passos e dentes travados começou a andar. Encontrou o xerife no meio do caminho. Ergueu a mão solta.

O auxiliar se aproximou com a espingarda abaixada. Notou o sangue empapando a camisa. Ele tá ferido, chefe. Três meninos vinham atrás, na expectativa do segundo tiroteio, e xingaram ao perceber que as cortinas não tornariam a abrir. Que aconteceu? Ele matou o Sr. Avarrias. O xerife engoliu seco, a cara vermelha. Venha cá, cê vai preso. Tava indo pra lá mesmo. Então continua, desgraçado. Joumar, cuida disso. Só volta pra delegacia quando o presunto tiver no caixão.

Costurra sentou na cama da cela e o xerife do outro lado, na cadeirona de couro. Desembucha. Quero saber por que matou o homem. Não vai demorar pros capatazes dele descerem da fazenda espumando. Me engracei com a filha, o senhor sabe. Ele disse que eu era vagabundo, que era filho de puta, que valia o meu peso em bosta. Falei que ela dizia outra coisa quando abria as pernas. Ele sacou, saquei também. Deu no que deu. E a menina, onde é que anda? Em casa. Avisei que ia falar com o pai dela, ela sabia que ia dar merda. Tinha que tentar. Mas não engulo desaforo não.

Ouviram cascos num galope rápido, a vingança do Sr. Avarrias descendo a rua. Não tenho como te proteger, rapaz. Eles são no mínimo oito e vão entrar atirando. Eu sei. Ainda tô com cinco balas. Pega o meu revólver aqui, mais seis. Brigado, agora sai pelos fundos. Vou ficar. Larga de ser burro, se ficar vai pro inferno comigo. É meu trabalho, minha obrigação. Olha, se eu sobreviver manda buscar o doutor, parece que tem ferro quente nas minhas entranhas. Diabo, por que inventou de fazer isso, enfrentar o Avarrias desse jeito? Achou que ele não ia retrucar? Sou homem de falar na cara. E agora tá aí, fudido, meio morto e prestes a virar peneira, e a troco do quê? Ah, dane-se. O xerife pegou a espingarda, ficou atrás da porta, engatilhou. Que cê tá fazendo? Te ajudando, moleque. Vou perder o emprego, vou perder tudo, mas vamos ver se pelo menos salvo o teu couro.

Costurra sorriu, segurando cada revólver numa mão. Brigado, pai.

  • Loreci Demeneghi

    Genial! Como sempre!