Mamãe saiu cedo

Mamãe, mamãe?

Empurro a porta do quarto mas mamãe não tá na cama. Nem na cozinha. Nem no quintal. Nem no pomar. Nem no celeiro. Pego o Joninha, mesmo com o bracinho rasgado e aparecendo tecido, calço a chinela e saio pra ver se mamãe tá na dona Benê.

Bom dia, dona Benê, tudo bem ca senhora? Só procurando mamãe, ela saiu de casa e não voltou ainda. Brigada. Se a senhora vê ela diz que tô procurando.

A fazenda de dona Benê é a mais perto mas não é tão perto, tanto que já tô sentindo o sol cramunhando na nuca. Mas se mamãe não tá em casa ela só pode ter ido na mercearia de nhô Dito. Continuo andando pra cidade. Que ela vai tá lá sim, ou na igreja. Na rua da mercearia tem uma aglomeração de gente rodeando alguma coisa, perto duma camionete bem grande desse povo da fazenda nova, um monstrengão barulhento. Nhô Dito me vê e sai meio trupicando pra me pegar no colo, me levando pra longe.

Bom dia, nhô Dito. Eu só tô procurando mamãe. O senhô sabe se ela veio comprar comida? Não, nhô Dito. Papai tá viajando, em Sapezal essa semana. Tô procurando mamãe, nhô Dito. Pode me descer. Não preciso que o senhor me carregue. Eu já sou bem grandinha. Nhô Dito, pode parar.

Ele me leva pra dentro da mercearia, fecha a porta, me senta numa cadeira atrás do caixa.

Nhô Dito, eu não quero água. Brigada. Mas esses pirulitos todos, o senhô não vai vender eles? E essa Maria-Mole? Essa rapadura? Esse refri? Nossa, nhô Dito, e nem é meu aniversário ainda. Por modo de que o senhor tá me dando tudo isso? Nhô Dito, posso deixar aqui enquanto procuro mamãe? Ela só pode tá na igreja. O senhô me dá licença? Nhô Dito? O senhô tá tremendo. O senhô tá com medo de alguma coisa? Aqui, segura o Joninha. Ele tira o medo da gente.