Provação [#130]

  • 30 de junho de 2014
  • Categoria: Fantasia

Fromer encaixou a pedra na funda e rodou. O goklah, uma grande ave de pelagem amarela e reluzente, cruzou o céu num rasante. O projétil zuniu e encontrou a cabeça do animal numa explosão que afastou os outros goklahs nas proximidades. A chama negra consumiu o animal até a barriga. A metade traseira, chamuscada, caiu na água.

- Maldição, Fromer! De novo usando as pedras explosivas da velha!
- As pedras normais não surtem efeito nesses bichos, Tómary.
- Não se você lançá-las como uma menina! Venha, vamos esperar eles se acalmarem e voltamos depois.

Retornaram ao vale duas horas mais tarde e andaram até a ribanceira. Por algum motivo os goklahs adoravam aquela parte do rio, mergulhando e fisgando os peixes, depositando-os nos inúmeros ninhos nos picos e montes circundantes, onde os filhotes se refestelavam. Tómary achou uma pedra de tamanho generoso e esperou. Quando o primeiro goklah apareceu foi atingido no dorso e caiu com um guincho desesperado. Os dois meninos correram ribanceira abaixo pela margem do rio, tentando alcançar o animal antes que chegasse à trilha de pedras, onde a correnteza era evitada, dali até a cachoeira um perigoso trecho onde outros já haviam perdido a vida. Fromer pulou e nadou com Tómary logo atrás, mas a correnteza caudalosa, resultado da chuva da manhã, foi mais forte. Voltaram à margem, cabisbaixos e exaustos.

Quinhentos metros acima, na margem direita, Káramo sorriu e enfiou a lente aumentadora da velha no bolso.

- É simples, Tobias. Espere lá no meio, a correnteza é fraca aqui.

O menino obedeceu. Aguardou, a água na altura do peito. Káramo ouviu o pio agudo de um goklah, que logo surgiu por cima das árvores, e apanhou a lança. A madeira trespassou o pescoço do animal quando mergulhava. O corpo se espatifou na água e correu para os braços de Tobias, que subiu a margem com o bicho morto nos ombros.

- Bela mira, Káramo.

Tobias deitou o goklah na grama e abriu o dorso com a faca. Retirou os órgãos e meteu a mão pelas costelas. Segurou o coração pulsante e deu um puxão, arrebentando as veias. Cortou o órgão em duas metades e entregou uma a Káramo. O sangue jorrou na boca feito melancia. Acabaram a refeição quente e se lavaram no riacho.

- É só isso?
- Que eu saiba só.
- E pulamos?
- É.

Káramo pulou. E não voltou ao chão. Levitou desengonçado, tentando controlar o poder emprestado das aves mágicas. Tobias fez o mesmo. Desceram o riacho na direção da vila, planando feito pássaros, ansiosos para mostrar que haviam passado no teste. Avistaram Fromer e Tómary deitados na grama. Eles levantaram e gritaram desaforos, derrotados. Mas Káramo e Tobias mal ouviram. Agora eram homens, e homens não se deixavam atingir por meninos.