Flash Fiction

Caetano era persistente.

Quando tinha seis anos e o primeiro dente caiu, a mãe disse que se colocasse embaixo do travesseiro a fada do dente o trocaria por uma nota de 10 reais. Caetano ficou contente, porque com 10 reais comprava três gibis da Turma da Mônica e dois chicletes. Mas não colocou embaixo do travesseiro. Um ano depois, quando juntara quatro deles numa gaveta, sua mãe perguntou por que não os trocava. Ele disse que queria juntar o bastante para pedir que a fada do dente trouxesse seu pai de volta.

O pai de Caetano deixou a família quando o menino tinha três anos. Doeu, mas fez o que julgava certo. Voltou a se casar algum tempo depois. Certa noite, depois de saber que a nova esposa estava grávida, disse que ia ao mercado e parou o carro a duas quadras da antiga casa. Tinha medo que o primeiro filho não lembrasse dele. Pegou o celular e ligou pra mãe de Caetano. Ela chorou, disse que ainda o amava e queria que ele voltasse.

A mãe de Caetano não calculou as consequências quando cedeu aos apelos do colega de trabalho. Ele era bonito e simpático. E insistente. Numa noite de hora extra, quando ficaram no escritório até tarde, ela não resistiu. Confessou ao marido, que saiu de casa. Ela nunca contou a Caetano a verdade. Achava injusto o menino acreditar que o pai simplesmente fugira, que não o amava, mas a coragem não vinha. Na noite em que o ex-marido ligou ela não se conteve. Implorou por perdão, pediu que voltasse e esquecesse tudo, disse que se arrependia, que nunca deixara de amá-lo.

Quando ouviu a mãe no celular, Caetano sabia que ela conversava com o pai. Ficou quieto, tentando entender. Não sabia por que se desculpava, mas viu que pedia que ele voltasse. Quando desligou, Caetano perguntou se isso aconteceria mesmo. Ela disse que não e começou a chorar. Ele buscou os dentes de leite no quarto. Perguntou à mãe se a fada ajudaria o pai a achar o caminho de volta para casa por apenas quatro deles, ou se ainda precisava juntar mais.