Acabou a bateria [#114]

Joaquim gostava do celular.

Bateu o carro enquanto olhava uma foto no Instagram. Viu o show do Metallica pela telinha, gravar pra posteridade. Perdeu o final do filme para comentar a montagem do Michael Jackson no Whatsapp. Não ouviu sobre a vaga de emprego na mesa do bar porque olhava as novidades no Face. Chegou atrasado na reunião, esperando o 3G funcionar para achar o endereço no Google Maps, não quis perguntar para ninguém na rua. Calculou as calorias do lanche no aplicativo e largou pela metade no prato. Deixou a mulher da sua vida passar batida na fila do banco para conseguir 3 estrelas numa fase do Angry Birds. A filha nasceu na mesma hora que a do Roberto, mas viu a dele antes, no e-mail.

Joaquim filosofou sobre a vida quando esqueceu de carregar o celular. A bateria morreu quando lia a mensagem de que acabara de ganhar um bônus para alguma coisa. 9 horas da manhã. Nenhum carregador compatível na empresa. Foram longos momentos de solidão, pensando em muitas coisas. No emprego. Na última namorada. Na mãe no asilo, que tinha que visitar logo. No roteiro que queria escrever e mandar para o Tarantino (nada é impossível, né), no churrasco que tinha que marcar com os amigos para comemorar o aniversário, há dois meses na lenga-lenga. Em como as horas do dia passavam rápido. Como não conseguia mais se concentrar para ler um livro. Engatou conversa com a recepcionista nova, descobriu que moravam no mesmo bairro. Pegou o número, podiam marcar um cinema no fim de semana, ver o novo do Woody Allen. Sentou feliz no seu cubículo, trabalhando por uma hora ininterrupta pela primeira vez em meses.

Mas alegria de pobre dura pouco.

No intervalo do almoço comprou um carregador no camelô.