Amor plástico [#185]

Eu quase sorri quando ele disse que me amava.

Era óbvio que amava. O jeito que me olhava, que se preocupava, que se compadecia pra satisfazer minhas mínimas vontades. Como ria quando chegava, como coçava a orelha quando partia, ansioso, incompleto. Como escrevia mensagens açucaradas no Whats, como compartilhava músicas no Face com algo de nosso nas letras, como ligava e deixava a secretária eletrônica atender e demorava pra falar depois do oi porque obviamente foi só no oi que pensou e só se rende a esses impulsos quem ama.

Inesperado seria não ouvir isso saindo da sua boca naquele abraço apertado. Eu te amo. E esperou a resposta. E ela não veio. E ficou me olhando do fundo daqueles olhos, cada vez mais distantes na cama até subirem e apagarem enquanto a camiseta passava por eles, e sumirem nas piscadas nervosas enquanto abotoava a calça e calçava a bota, e desaparecerem.

Rezei bastante, esperando que encontrasse alguém capaz de correspondê-lo. Não adiantava. Reclamava e derrotado se arrastava e se afogava num aperto forte que desencaixava o braço, e o encaixava beijando minha boca semi-aberta incondizente com sua língua ágil e grudenta.

Eu precisava de mais pra amar. Precisava de mais pra falar, pra andar, pra fazer qualquer coisa que não fosse ficar deitada observando o mundo juntar poeira. Eu observava meus braços de plástico curvilíneo, dedos gordos, pernas brilhosas e lisas. Vestido com velcro atrás, tiara florida, sapatos escuros. Ele precisava de mais.

No fim fui trocada por um novo modelo, uma escoteira ruiva. Ainda continuei feito amante indesejada no canto até cansar e me doar num bazar beneficente. Na casa da minha nova dona sou apertada e acariciada, mas nunca do mesmo jeito, nunca com aquelas mãos fortes, e quando ela diz que me ama num agudo cantado não é a mesma coisa. Não tenho vontade de sorrir. Não sinto nada.