Mijando no busão [#69]

Levantei do banco com um objetivo simples: tirar água do joelho.

O busão balançava na estrada naquele molejo tranquilo e andei pelo corredor até o fundo. A maior parte do pessoal cochilava, uns tentavam ler aproveitando a claridade vacilante da janela, outros tiravam o olhar do vazio pra me ver passar. Abri a portinha, o banheiro aquela coisa minúscula e elevada. Se fora o cabelo já raspava o teto aqui eu era obrigado a baixar a cabeça, pose corcunda de quem foge da chuva. A privadinha já tava decorada com mijadas de terceiros, que não se preocuparam em limpar a porra do assento, então eu também não ia limpar. Coitada da mulher que entrasse depois. Encaixei os joelhos nas paredes, abri o zíper e o jato atingiu o fundo do funil improvisado na hora que o ônibus fez a curva.

Agora, vale lembrar a dificuldade básica do ato de “cortar o mijo”. Não é algo que se faça por vontade própria, a não ser no laboratório quando pedem o famigerado Jato Do Meio. Aqui eu achei melhor me adaptar às circunstâncias. Fui pro lado direito, joguei as costas na parede tentando controlar a mira e senti o joelho gritar, prensado contra a reentrância da pia. Na curva de volta repeti o processo e o outro joelho estralou na porrada contra o plástico. Dei de cara com a janelinha, vi que chegamos num trevo. UMA HORA DE ESTRADA TRANQUILA E ME VEM UM CARALHO DE TREVO JUSTO AGORA, pensei. Mas beleza. Olhei pra baixo e vi que lavei as duas laterais. Lá ia eu gastar cinco minutos limpando aquilo.

Daí o busão freou. Fui pra frente com tudo. A reação foi levar a mão à parede. O dito cujo liberto fez o que bem entendeu e esguichou na calça, no tênis e na camisa. Tranquei a torrente fazendo careta. Daí veio a lombada. Soquei a corcunda no teto, o joelho escapou, a válvula abriu de novo, foi mijo pela parede e pra tudo que é lado. Desisti, baixei a calça e terminei o restinho ali, sentado na imundice. Ouvi os meninos gritando lá fora, carambola!, mexerica!, amora!, 5 reais! Esperei as lombadas acabarem pra me levantar. Daí sentei de novo, resignado. Só saía dali na rodoviária, depois que todo mundo tivesse descido.

3 minutos mais tarde a batida na porta, uma senhora apurada. Sabe o que eu fiz? Até agora não acredito. Foi cabuloso. Pensando bem, larga mão, já me queimei demais contando até aqui. Na verdade esquece tudo. Não vale a pena. Outro dia eu conto, tá?