Sinusite

A cabeça explodia. Fora a gripe, um latejar intenso atrás do olho e da sobrancelha. O farmacêutico disse que era sinusite e me vendeu um frasco com óleo para diluir em água fervente e fazer nebulização.

Em casa esquentei a água, despejei numa bacia e me cobri com uma toalha. A fumaça pinicava os olhos e esquentava o rosto, percorria as narinas e a garganta, se entrincheirava na barba e formava gotículas que caíam de volta na nascente. Alguns minutos disso em intervalos seriam suficientes para desmanchar as placas de muco instaladas na testa e ao redor do olho, me afirmou o farmacêutico.

Realmente, após a primeira nebulização a quantidade de catarro que despejei em caminhas de papel higiênico aumentou. Ela continuou num ritmo estável até a quarta nebulização, quando após uma assoada megalomaníaca senti descer pela narina direita o que só poderia ser o catarro ancião, o Yoda dos catarros. O alívio foi imediato. Não fechei na sequência o receptáculo do Último e Grande Catarro pois precisava admirá-lo em toda a sua grandeza.

Mergulhada na poça esbranquiçada havia uma boca verde. Uma boquinha mole, gelatinosa, abrindo e fechando. Aproximei a orelha e ouvi as palavras “não não por favor não”. Fiz carinho com o dedo por baixo do papel. Resolvi arrancar o saco de lixo do cesto e abri cada um dos papéis amassados.

Minha esposa apareceu e perguntou, incrédula, o que eu fazia. Expliquei em poucas palavras. Ela me ajudou. Achamos, minúsculos, só visível a olhos realmente atentos, o resto do corpo. Os braços, as pernas, o tronco e o resto da cabeça.

Quando encaixei o último pedaço, ele sentou. Tremia como um pote de gelatina remexido. Disse que eu estava equivocado. Ele fazia parte de mim, era integrante do meu sistema imunológico. Acabou congelado na parte frontal do meu rosto ao tentar extirpar uma célula cancerígena que se formava no lobo frontal. Conseguiu, mas como resultado teve o corpo inutilizado. Não era catarro, e era um engano terrível que tivesse sido tratado como tal.

Minha mulher me abraçou. Um câncer no cérebro, graças a Deus ele estava aí. Ela superou o nojo e o depositou na minha orelha direita, onde ele disse que a reabsorção seria mais fácil. Perguntei se não precisava de algo antes de voltar. Ele pediu pra eu comer mais alface e maneirar na cerveja.