Zika

O mosquito te picou, meu rei. Rei de tudo, rei de todos. Tua vontade é lei, senhor, abençoa a mão deste teu servo, aparta uma fatia insignificante da tua disposição para retribuir a fé que tenho em vossa majestosa figura. Salve, meu rei, salve.

O mosquito que te picou, meu rei, me picou também, picou todos nós, nos presenteou com quantias abençoadas do teu sangue no nosso sangue, agora somos todos uno no um com nós todos vós sereis para sempre um e eterno. Ademais, meu rei, abristes as portas do nosso desejo flamejante, atirastes teu manto benevolente sobre nós, e agora amamos tremendamente como jamais amamos, há um desejo de pegar e tocar a carne e se abraçar com uma violência tamanha que desejamos não desgrudar nossos corpos um dos outros, meu rei, mas há de todo jeito um mal sempre à espreita que teima em nos tentar.

O mosquito que te picou, meu rei, também picou vários de nós antes de ti e assim te infectamos com nossas lamúrias e nossas depravações e todo o mal que cozinhamos em panelas de barro nas cozinhas da alma, refeições invejosas que não entendemos mas engolimos qual presente nos reservaram as bênçãos daquele que repousa acima das nuvens, e assolado por tal infecção descestes ao nível mais baixo, meu rei, engatastes teus dentes nas carcaças fétidas que até os cães deixaram para nós, te enfiastes nos corpos mais sujos vezes sem conta para satisfazer sabe-se lá qual dos nossos desejos traiçoeiros te tomavam, te apossastes de nossas lâminas curvas para satisfazer os gozos dos sentimentos mais profanos, meu rei, fostes maculado.

Vê, meu rei, que o mosquito que te picou e nos picou e continuará picando é talvez a mais sábia oferenda, visto que nos dá o vislumbre dos traquejos da vida do lado de lá da cortina da nossa sorte, e encena tal dramaturgia do jeito mais melodioso e sereno, meu rei, meu eterno, meu tudo. Vê, senhor, que no fim tudo que te foi negado te será entregue em dobro–

Márcio, paga logo um lanche presse tio deixar a gente em paz. Saporra fede.